Machado de Assis

Fátima CChaves


"A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal."

- Machado de Assis, em "'Iaiá Garcia'.

"Trata de saborear a vida; e fica sabendo, que a pior filosofia é a do choramingas que se deita à margem do rio para o fim de lastimar o curso incessante das águas. O ofício delas é não parar nunca; acomoda-te com a lei, e trata de aproveitá-la."

- Machado de Assis, em "'Memórias Póstumas de Brás Cubas”.

"A alma da gente, como sabes, é uma casa assim disposta, não raro com janelas para todos os lados, muita luz e ar puro. Também as há fechadas e escuras, sem janelas ou com poucas e gradeadas, à semelhança de conventos e prisões. Outrossim, capelas e bazares, simples alpendres ou paços suntuosos."

- Machado de Assis, em "'Dom Casmurro”.

"Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa apagar o caso escrito."

- Machado de Assis, em "Verba testamentária".

"As pessoas valem o que vale a afeição da gente, e é daí que mestre Povo tirou aquele adágio que quem o feio ama bonito lhe parece."

- Machado de Assis, em "'Dom Casmurro”.

"...o coração, quando examina a possibilidade do que há de vir, as proporções dos acontecimentos e a cópia deles, fica robusto e disposto, e o mal é menor mal. Também, se não fica então, não fica nunca."

- Machado de Assis, em "'Dom Casmurro”.

"Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes."

- Machado de Assis, em "'Memórias Póstumas de Brás Cubas' - Capítulo XVII".

"A ausência diminui as paixões medíocres e aumenta as grandes, como o vento apaga as velas e atiça as fogueiras."

- Machado de Assis, em "Contos escolhidos".

"O destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho. Eles chegam a seu tempo, até que o pano cai, apagam-se as luzes, e os espectadores vão dormir."

- Machado de Assis, em "Dom Casmurro".

"Nem tudo é claro na vida ou nos livros."

- Machado de Assis, em "Dom Casmurro".

"Por que razão os sonhos hão de ser assim tão tênues que se esgarçam ao menor abrir de olhos ou voltar de corpo, e não continuam mais?"

- Machado de Assis, em "Dom Casmurro".

"A minha alegria acordava a dele, e o céu estava tão azul, e o ar tão claro, que a natureza parecia rir também conosco. São assim as boas horas deste mundo."

- Machado de Assis, em "Dom Casmurro".

“Os olhos continuaram a dizer coisas infinitas, as palavras de boca é que nem tentavam sair, tornavam ao coração caladas como vinham…”

- Machado de Assis, em “Dom Casmurro”.

"Aí vinham a cobiça que devora, a cólera que inflama, a inveja que baba, e a enxada e a pena, úmidas de suor, e a ambição, a fome, a vaidade, a melancolia, a riqueza, o amor, e todos agitavam o homem, como um chocalho, até destruí-lo, como um farrapo. Eram as formas várias de um mal, que ora mordia a víscera, ora mordia o pensamento, e passeava eternamente as suas vestes de arlequim, em derredor da espécie humana. A dor cedia alguma vez, mas cedia à indiferença, que era um sono sem sonhos, ou ao prazer, que era uma dor bastarda. Então o homem, flagelada e rebelde, corria diante da fatalidade das coisas, atrás de uma figura nebulosa e esquiva, feita de retalhos, um retalho de impalpável, outro de improvável, outro de invisível, cosidos todos a ponto precário, com a agulha da imaginação; e essa figura, - nada menos que a quimera da felicidade, - ou lhe fugia perpetuamente, ou deixava-se apanhar pela fralda, e o homem a cingia ao peito, e então ela ria, como um escárnio, e sumia-se, como uma ilusão."

- Machado de Assis, em "'Memórias póstumas de Brás Cubas”.

"Há frases felizes. Nascem modestamente, como a gente pobre; quando menos pensam, estão governando o mundo, à semelhança das ideias. As próprias ideias nem sempre conservam o nome do pai; muitas aparecem órfãs, nascidas de nada e de ninguém. Cada um pega delas, verte-as como pode, e vai levá-las à feira, onde todos as têm por suas."

- Machado de Assis, em "Esaú e Jacó".

"Como é que se matam saudades não é coisa que se explique de um modo claro. Há quem creia que, ainda mortas, são doces, mais que doces."

- Machado de Assis, em "Esaú e Jacó".

" - Penso que o amor verdadeiro, ou ao menos o melhor é o que não vê nada em volta de si, e caminha direito, resoluto e feliz aonde o leva o coração.

- Não basta que o coração lhe diga: ame a este; é preciso que os olhos aprovem a escolha do coração. Eleja um marido digno, um espírito que a entenda, que a admire, um homem que a possa honrar; não se deixe levar dos primeiros olhos que pareçam responder aos seus."

- Machado de Assis, em "Iaiá Garcia".

"Decidam lá os doutores da escritura qual destes dois amores é melhor, se o que vem de golpe, se o que invade a passo lento o coração. Eu por mim não sei decidir, ambos são amores, ambos têm suas energias."

- Machado de Assis, em "Ressurreição".

"É meu velho costume levantar-me cedo e ir ver as belas rosas, frescas murtas, e as borboletas que de todas as partes correm a amar no meu jardim. Tenho particular amor às borboletas. Acho nelas algo das minhas idéias, que vão com igual presteza, senão com a mesma graça."

- Machado de Assis. Gazeta de Notícias, 19.02.1893.

"Estabelecei a crítica, mas a crítica fecunda, e não a estéril, que nos aborrece e nos mata, que não reflete nem discute, que abate por capricho ou levanta por vaidade; estabelecei a crítica pensadora, sincera, perseverante, elevada - será esse o meio de reerguer os ânimos, promover os estímulos, guiar os estreantes, corrigir os talentos feitos; condenai o ódio, a camaradagem e a indiferença — essas três chagas da crítica de hoje; ponde, em lugar deles, a sinceridade, a solicitude e a justiça — e só assim que teremos uma grande literatura."

- Machado de Assis, em "Diário do Rio de Janeiro" 08.10.1865.

"Daqui inferi eu que a vida é o mais engenhoso dos fenômenos, porque só aguça a fome, com o fim de deparar a ocasião de comer, e não inventou os calos, senão porque eles aperfeiçoam a felicidade terrestre. Em verdade vos digo que toda a sabedoria humana não vale um par de botas curtas."

- Machado de Assis, em "'Memórias Póstumas de Brás Cubas”.

"E enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo, meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando seria monótono, tudo rindo, cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o equilíbrio da vida."

- Machado de Assis, em "'Quincas Borba”.

Versos

Pede estrelas ao céu, ao campo flores;

Flores e estrelas ao gentil regaço

Virão da terra ou cairão do espaço,

Por te cobrir de aromas e esplendores.

Versos... pede-os ao vate peregrino

Que ao céu tomando inspirações das suas,

A tua mocidade e as graças tuas

Souber nas notas modular de um hino.

Mas que flores, que versos ou que estrelas

Pedir-me vens? A musa que me inspira

Mal poderia celebrar na lira

Dotes tão puros e feições tão belas.

Pois que me abris, no entanto, a porta franca

Deste livro gentil, casto e risonho,

Uma só flor, uma só flor lhe ponho

E seja o nome angélico de Branca.

- Machado de Assis, em "Escritos no álbum da Exma. Sra. D. Branca P. da C.. - Manuscrito pertencente ao Arquivo Nacional".

O meu viver

Chama-se a vida a um martírio certo

Em que a alma vive se morrer não pode,

É crer que há vida p'ra o arbusto seco,

Que as folhas todas para o chão sacode.

Dizer que eu vivo... e minha mãe perdi,

Minha alma geme e o coração de amores,

É crer que um filho, sem a mãe... sozinho,

Também existe, com pungentes dores.

Dizer que vivo, se ausente existo

Da amante terna, tão formosa e pura,

E crer que triste desgraçado preso

Vive também lá na masmorra escura.

Quero despir-me desta vida má,

Quero ir viver com minha mãe nos céus,

Quero ir cantar os meus amores todos,

Quero depois em ti pensar, meu Deus!

- Machado de Assis, em "Obra Completa - Machado de Assis".

Esta noite

Os teus beijos ardentes,

Teus afagos mais veementes,

Guarda, guarda-os, anjo meu;

Esta noite entre mil flores,

Um sonho todo de amores

Nos dará de amor um céu!

- Machado de Assis, em "Marmota Fluminense, 16 fev. 1858". Em ASSIS, Machado. "Toda poesia de Machado de Assis"..

A saudade

[Ao meu primo o Sr. Henrique José Moreira]

Meiga saudade! — Amargos pensamentos

A mente assaltam de valor exausta,

Ao ver as roxas folhas delicadas

Que singelas te adornam.

Mimosa flor do campo, eu te saúdo;

Quanto és bela sem seres perfumada!

Que te inveja o jasmim, a rosa e o lírio

Com todo o seu perfume?

Repousa linda flor, num peito f 'rido,

A quem crava sem dó a dor funesta,

O horrível punhal, que fere e rasga

Um débil coração.

Repousa, linda flor, vem, suaviza

A frágua que devora um peito ansioso,

Um peito que tem vida, mas que vive

Envolto na tristeza!...

Mas não... deixo-te aí causando inveja;

Não partilhes a dor que me consome,

Goza a ventura plácida e tranqüila,

Mimosa flor do campo.

- Machado de Assis, em "Marmota Fluminense, 20.03.1855".

Horas vivas

Noite; abrem-se as flores...

Que esplendores!

Cíntia sonha amores

Pelo céu.

Tênues as neblinas

Às campinas

Descem das colinas,

Como um véu.

Mãos em mãos travadas

Animadas,

Vão aquelas fadas

Pelo ar;

Soltos os cabelos,

Em novelos,

Puros, louros, belos,

A voar.

— "Homem, nos teus dias

Que agonias,

Sonhos, utopias,

Ambições;

Vivas e fagueiras,

As primeiras,

Como as derradeiras

Ilusões!

— Quantas, quantas vidas

Vão perdidas,

Pombas malferidas

Pelo mal!

Anos após anos,

Tão insanos,

Vêm os desenganos

Afinal.

— Dorme: se os pesares

Repousares.

Vês? — por estes ares

Vamos rir;

Mortas, não; festivas,

E lascivas,

Somos — horas vivas

De dormir. —"

- Machado de Assis, em "Crisálidas".

"(...) gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou."

- Machado de Assis, em "'Memórias Póstumas de Brás Cubas' -

Retrato de Machado de Assis, por

Henrique Bernardelli (1905)

Machado de Assis - Joaquim Maria Machado de Assis (21 de junho de 1839, Rio de Janeiro - 29 de setembro de 1908, Rio de Janeiro). Jornalista, escritor, poeta, teatrólogo e crítico literário brasileiro.

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