Raquel de Queiroz

Fátima CChaves


“O homem feliz é o que não tem passado. O maior dos castigos, para o qual só há pior no inferno, é a gente recordar. Lembranças que vem de repente e ataca como uma pontada debaixo das costelas, ali onde se diz que fica o coração. Alguém pode ter tudo, mocidade, dinheiro no bolso, um bom cavalo debaixo das pernas, o mundo todo ao seu dispor. Mas não pode usufruir nada disso por quê? Porque tem as lembranças perturbando. O passado te persegue, como um cão perverso nos teus calcanhares. Não há dia claro, nem céu azul, nem esperança de futuro, que resista ao assalto das lembranças.”

- Rachel de Queiroz, em "Memorial de Maria Moura".

"Doer, dói sempre.

Só não dói depois de morto.

Porque a vida toda é um doer."

- Rachel de Queiroz, em "Dôra, Doralina: romance".

"...Não gosto de memórias. Nunca pretendi escrever memória alguma. Se quiser, terá que me extorquir as lembranças do passado, as coisas que testemunhei, as pessoas que conheci... Há coisas na vida de cada um, que não se contam..."

- Rachel de Queiroz

Geometria dos ventos

Eis que temos aqui a Poesia,

a grande Poesia.

Que não oferece signos

nem linguagem específica, não respeita

sequer os limites do idioma. Ela flui, como um rio.

como o sangue nas artérias,

tão espontânea que nem se sabe como foi escrita.

E ao mesmo tempo tão elaborada -

feito uma flor na sua perfeição minuciosa,

um cristal que se arranca da terra

já dentro da geometria impecável

da sua lapidação.

Onde se conta uma história,

onde se vive um delírio; onde a condição humana exacerba,

até à fronteira da loucura,

junto com Vincent e os seus girassóis de fogo,

à sombra de Eva Braun, envolta no mistério ao

mesmo tempo

fácil e insolúvel da sua tragédia.

Sim, é o encontro com a Poesia.

- Rachel de Queiroz

Telha de Vidro

Quando a moça da cidade chegou,

veio morar na fazenda

na casa velha...

tão velha...

quem fez aquela casa foi seu bisavô...

Deram-lhe para dormir a camarinha,

uma alcova sem luzes, tão escura!

Mergulhada na tristura

de sua treva e de sua única portinha..a.

A moça não disse nada;

mas mandou buscar na cidade

uma telha de vidro,

queria que ficasse iluminada

sua camarinha sem claridade...

Agora

o quarto onde ela mora

e o quarto mais alegre da fazenda.

Tão clara que, ao meio-dia, aparece uma renda

de arabescos de sol nos ladrilhos vermelhos

que, apesar de tão velhos,

só agora conhecem a luz do dia...

A lua branca e fria

também se mete às vezes pelo claro

da telha milagrosa...

ou alguma estrelinha audaciosa

carateia no espelho onde a moça se penteia...

Você me disse um dia

que sua vida era toda escuridão

cinzenta, fria,

sem um luar, sem um clarão...

Por que você não experimenta?

A moça foi tão bem sucedida?

Ponha uma telha de vidro em sua vida!

- Rachel de Queiroz, em "Mandacaru".

"Cada coisa tem sua hora e cada hora o seu cuidado".

-Raquel de Queiroz, “Formosa Lindomar”, em “Raquel de Queiroz”.

"Fala-se muito na crueldade e na bruteza do homem medievo. Mas o homem moderno será melhor?"

- Rachel de Queiroz, em "As terras ásperas".

"Morrer, só se morre só. O moribundo se isola numa redoma de vidro, ele e a sua agonia. Nada ajuda nem acompanha."

- Rachel de Queiroz, em "O brasileiro perplexo; histórias e crônicas: histórias e crônicas".

"[...] tento, com a maior insistência, embora com tão precário resultado (como se tornou evidente), incorporar a linguagem que falo e escuto no meu ambiente nativo à língua com que ganho a vida nas folhas impressas. Não que o faça por novidade, apenas por necessidade. Meu parente José de Alencar quase um século atrás vivia brigando por isso e fez escola."

- Rachel de Queiroz

"A vida eu acho que ensina surrando..."

-Raquel de Queiroz

“Olha, gosto do ser humano, gosto da humanidade, gosto dos meus próximos e gosto dos distantes.”

-Raquel de Queiroz, entrevista no programa Roda Viva da TV Cultura.

Raquel de Queiroz ( 17 de novembro de 1910, Fortaleza CE - 04 de novembro de 2003, Rio de Janeiro). Escritora, tradutora e teatróloga brasileira.

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