Eliane Potiguara
Fátima CChaves
“Bonito é renascer todos os dias.”
-Eliane Potiguara
Pankararu
Sabe, meus filhos...
Nós somos marginais das famílias
Somos marginais das cidades
Marginais das palhoças...
E da história?
Não somos daqui
Nem de acolá...
Estamos sempre ENTRE
Entre este ou aquele
Entre isto ou aquilo!
Até onde aguentaremos, meus filhos?...
- Eliane Potiguara, no livro "Metade Cara, Metade Máscara".
Eu não tenho minha aldeia...
Eu não tenho minha aldeia
Minha aldeia é minha casa espiritual
Deixada pelos meus pais e avós
A maior herança indígena.
Essa casa espiritual
É onde vivo desde tenra idade
Ela me ensinou os verdadeiros valores
Da espiritualidade
Do amor
Da solidariedade
E do verdadeiro significado
Da tolerância.
Mas eu não tenho a minha aldeia
E a sociedade intolerante me cobra
Algo físico que não tenho
Não porque queira
Mas porque de minha família foi tirada
Sem dó, nem piedade.
Eu não tenho minha aldeia
Mas tenho essa casa iluminada
Deixada como herança
Pelas mulheres guerreiras
Verdadeiras mulheres indígenas
Sem medo e que não calam sua voz.
Eu não tenho minha aldeia
Mas tenho o fogo interno
Da ancestralidade que queima
Que não deixa mentir
Que mostra o caminho
Porque a força interior
É mais forte que a fortaleza dos preconceitos.
Ah! Já tenho minha aldeia
Minha aldeia é meu Coração ardente
É a casa de meus antepassados
E do topo dela eu vejo o mundo
Com o olhar mais solidário que nunca
Onde eu possa jorrar
Milhares de luzes
Que brotarão mentes
Despossuídas de racismo e preconceito.
- Eliane Potiguara, no livro "Metade Cara, Metade Máscara".
Brasil
Que faço com minha cara de índia?
E meus cabelos
E minhas rugas
E minha história
E meus segredos?
Que faço com minha cara de índia?
E meus espíritos
E minha força
E meu Tupã
E meus círculos?
Que faço com minha cara de índia?
E meu toré
E meu sagrado
E meus “cabocos”
E minha Terra?
Que faço com minha cara de índia?
E meu sangue
E minha consciência
E minha luta
E nossos filhos?
Brasil, o que faço com minha cara de índia?
Não sou violência
Ou estupro
Eu sou história
Eu sou cunha
Barriga brasileira
Ventre sagrado
Povo brasileiro.
Ventre que gerou
O povo brasileiro
Hoje está só...
A barriga da mãe fecunda
E os cânticos que outrora cantavam
Hoje são gritos de guerra
Contra o massacre imundo.
- Eliane Potiguara, no livro "Metade Cara, Metade Máscara".
“O povo indígena sobrevive há séculos de opressão porque tem como maior referencial, a tocha da ancestralidade, do perceber intuitivo, da leitura e da percepção dos sonhos, o exercício da dança como expressão máxima da espiritualidade e da valorização da cultura, das tradições, da cosmovisão personificada na figura dos mais velhos e das mais velhas, os idosos planetários."
- Eliane Potiguara, no livro "Metade Cara, Metade Máscara".
Eliane Potiguara ( Eliane Lima dos Santos, origem étnica Potiguara, do tronco Tupi Guarany). Nasceu em 29 de setembro de 1950 no Rio de Janeiro. Ativista, professora e escritora brasileira.