Mario Roso de Luna

Fátima CChaves


A Verdade e a Mentira

Certo dia, o último da Idade de Ouro, a Mentira surpreendeu a Verdade enquanto dormia; arrebatou suas alvas vestimentas, vestiu-se com elas e, assim trajada, tornou-se a única soberana da Terra.

O mundo, seduzido pelo falso brilho da Mentira disfarçada de Verdade, perdeu a sua primitiva inocência, renunciando à toda Sabedoria, à toda probidade e à toda justiça.

Expulsa e menosprezada, a Verdade se rendeu, desde então, à Mentira, que lhe usurpara o nome e o culto. Tudo o que a Verdade dizia era considerado falso, e tudo o que fazia era julgado como a mais intolerável das extravagâncias.

A despeito, pois, dos seus legítimos privilégios, a Verdade chegou a suplicar que a ouvissem, mas, em todos os lugares que visitou, foi rechaçada com maus modos. Houve, até, um insolente que se atreveu a qualificar de libertinagem a sua casta e ingênua nudez! «Vai-te para longe daqui, mulher abominável. Como te atreves a aparecer nua diante dos nossos olhos pudicos? Jamais conseguirás nos seduzir com os teus absurdos!»

A Verdade, convencida de que a Humanidade a execrava, foi para o deserto. Nem bem havia chegado, encontrou perto de umas sarças as espalhafatosas roupas que a Mentira havia abandonado quando roubou as suas e, como não tinha outras, vestiu-as, ficando assim a Verdade disfarçada com a roupa característica da Mentira…

Assim transformada, pôde retornar para junto dos homens que a acolheram com espanto e alegria. Os mesmos que antes se tinham escandalizado com a sua nudez, foram os que melhor a receberam sob esta nova aparência e com o belo nome de fábula, ou parábola, que ela adotou.

- Mario Roso de Luna

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