Darcy Ribeiro

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“Sempre fui, em toda a minha vida adulta, um cidadão ciente de mim mesmo como um ser dotado de direitos e investido de deveres. Sobretudo o dever de intervir nesse mundo para melhorá-lo.”

- Darcy Ribeiro


"...Sou um homem de causas. Vivi sempre pregando, lutando, como um cruzado, pelas causas que comovem. Elas são muitas demais: a salvação dos índios, a escolarização das crianças, a reforma agrária, o socialismo em liberdade, a universidade necessária. Na verdade somei mais fracassos que vitórias em minhas lutas, mas isso não importa. Horrível seria ter ficado ao lado dos que nos venceram nessas batalhas."

- Darcy Ribeiro, em "O Brasil como problema", 1995.


Janelas

“Compus assim um fundo de mim, sobre o qual se assenta minha vida, como um ser de minha geração. Algumas janelas prodigiosas se abriram à minha frente, mostrando o mundo. A primeira delas foi a literatura. Li todos os livros que andavam de mão em mão em Montes Claros. Romances de muitos volumes ou de muitíssimas páginas. (...) Outra janela esplendorosa foi o cinema, que me ofertou todos os pródigos que o mundo oferecia. Nele vi com meus olhos como a vida pode variar, as mil formas de ser do amor, da desgraça, do drama, do gozo e da dor. (...) Minha máquina de pensar foi montada com esses componentes. A vida mesma que observava ali, ao meu redor, espiando, bisbilhotando, era muito menos expressiva que a literatura me dando, revivida em palavras, destinos muito mais impressionantes."

- Darcy Ribeiro, em "Confissões", 1997.



(...) Sem a livraiada do tio Plínio eu não seria quem sou. Livros são os tijolos de que são feitos os intelectuais. (...) Esse meu culto aos livros é velha adoração. Vivi mais horas de minha vida lendo, escrevendo, do que vivendo. Gastei mais com livro do que com qualquer outra coisa. Assim foi que enchi tantas estantes. (...) Essa realidade irreal, reflexa, postiça, artificial, simbólica, conceitual, é minha realidade mais real. Meu mundo é o da escritura, das idéias, da representação. Nisso é que verdadeiramente vivo, apenas saindo em fugas para atender a urgências fisiológicas ou mercar palavras com outras pessoas. (...) Na verdade, as ações concretas a que me dei por anos e anos na convivência (...) e no ativismo político foram comandos de minhas idéias, imperativos éticos que me impus, convicções a que me dei e a que me dou apaixonado."

- Darcy Ribeiro, em "Confissões", 1997.



Registro feito por Berta Ribeiro: Darcy e indígenas Urubus-Kaapor. Antropólogo teve vasta experiência com etnia em campo. Foto: Fundação Darcy Ribeiro



“Temos, essencialmente, o mesmo corpo de hábitos e costumes que é uma variante da versão da cultura mediterrânea europeia. É verdade que recheada de componentes culturais e genéticos índios e negros de quem herdamos múltiplos sabores, saberes, sensibilidades, musicalidades, ritmos e pendores."

- Darcy Ribeiro, em “América Latina: a pátria grande”.


"A distância social mais espantosa do Brasil é a que separa e opõe os pobres aos ricos. A ela se soma a discriminação que pesa sobre índios, mulatos e negros."

- Darcy Ribeiro em "O Povo Brasileiro".


“…Todos nós, brasileiros, somos carne da carne daqueles negros e índios supliciados. Todos nós brasileiros somos, por igual, a mão possessa que os supliciou. A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjugaram para fazer de nós sentida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também somos. Como descendentes de escravos e de senhores de escravos, seremos sempre servos da maldade destilada e instilada em nós, tanto pelo sentimento da dor intencionalmente produzida para doer mais, quanto pelo exercício da brutalidade sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças convertidas em pasto de nossa fúria. A mais terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a cicatriz de torturador impressa na alma e pronta a explodir na brutalidade racista e classista.”

- Darcy Ribeiro em "O Povo Brasileiro".



"Política: é a atividade humana fundamental. É aquilo que move o destino humano. É aquilo que define o que vai acontecer com comunidades. É vitalmente importante."

- Darcy Ribeiro, no “Roda Viva/TV Cultura”, em 17 abr. 1995.


"Comi a vida sôfrego. Ainda, como ávido, sem nenhum fastio ou tédio. Quero mais. Para isso fui feito. Para comer a vida. Para agir, para pensar, para escrever. Isso sou eu. Máquina de pensar, de fazer, faminto de fazimentos. Cheio de fé nos homens, nas gentes."

- Dary Ribeiro, em "Confissões". Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 1997.


"Eu não tenho medo da morte. A morte é apagar-se, como apagar a luz. Presente, passado e futuro? Tolice. Não existem. A vida vai se construindo e destruindo. O que vai ficando para trás com o passado é a morte. O que está vivo vai adiante."

- Darcy Ribeiro


"Creio haver provado que só há uma solução para os problemas brasileiros da educação. Uma única. Exclusivamente uma: levar a educação a sério. É enfrentar a tarefa de criar, aqui e agora, para todas as crianças, a escola primária, universal e gratuita que o mundo criou."

- Darcy Ribeiro


“Nosso povo preservará, depois dessa drástica cirurgia, a vitalidade indispensável para sair do atraso ou estará condenado a afundar cada vez mais no subdesenvolvimento?

Quem está interessado em que o Brasil seja capado e esterilizado?

Serão brasileiros?”

- Darcy Ribeiro, “O Brasil como Problema”.



"Fracassei em tudo o que tentei na vida.

Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.

Tentei salvar os índios, não consegui.

Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.

Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.

Mas os fracassos são minhas vitórias.

Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."

- Darcy Ribeiro


“'Quem sou eu? Às vezes me comparo com as cobras, não por serpentário ou venenoso, mas tão-só porque eu e elas mudamos de pele de vez em quando. Usei muitas peles nessa minha vida já longa, e é delas que vou falar.

A primeira de minhas peles que vale a pena ser recordada é a do filho da professora primária, Mestra Fininha, de uma cidadezinha do centro do Brasil.

Outra saudosa pele minha foi a de etnólogo indigenista. Vestido nela, vivi dez anos nas aldeias indígenas do Pantanal e da Amazônia.

Não os salvei e esta é a dor que mais me dói. Apenas consolam algumas poucas conquistas, como a criação do Parque Indígena do Xingu e do Museu do Índio, no Rio de Janeiro.

Pele que encarnei e encarno ainda, com orgulho, é a de educador, função que exerço há quatro décadas. Essa, de fato, foi minha ocupação principal desde que deixei etnologia de campo.

Eu investia contra o analfabetismo ou pela reforma da universidade com mais ímpeto de paixão que sabedoria pedagógica. Não me dei mal. Acabei ministro de educação de meu país e fundador e primeiro reitor da Universidade de Brasília.

Outra pele que ostentei e ostento ainda é a de político. Sempre fui, em toda a minha vida adulta, um cidadão ciente de mim mesmo como um ser dotado de direitos e investido de deveres. Sobretudo o dever de intervir nesse mundo para melhorá-lo.

Com a pele de político militante fui duas vezes ministro de Estado, mas me ocupei fundamentalmente foi na luta por reformas sociais, que ampliassem as bases da sociedade e da economia, a fim de criar uma prosperidade generalizável a toda a população.

Fracassando nessa luta pelas reformas, me vi exilado por muitos anos e vivi em diversos países. Minha pele de proscrito foi mais leve do que poderia supor.

Meu ofício naqueles anos foi de professor de antropologia e, principalmente, reformador de universidades. Disto vivi.

No exílio, devolvido a mim, me fiz romancista, cumprindo uma vocação precoce que me vem da juventude.

Só no meu exílio, nos seus longos vagares, tive ocasião e desejo de novamente romancear.

De volta do exílio, retomei minhas peles todas. Hoje estou no Brasil lutando pelas minhas velhas causas: salvação dos índios, educação popular, a universidade necessária, o desenvolvimento nacional a democracia, a liberdade. No plano político, fui eleito vice-governador do Rio de Janeiro e depois senador da República.

Essas são as peles que tenho para exibir. Em todas e em cada uma delas me exerci sempre igual a mim, mas também variando sempre.”


-Darcy Ribeiro, “O Brasil como Problema”.


"Na verdade, sou um homem feito muito mais de dúvidas que de certezas, e estou sempre predisposto a ouvir argumentos e a mudar de opinião. Tenho mudado muitas vezes na vida. Felizmente."

- Darcy Ribeiro





Darcy Ribeiro - foto: Acervo Fundar



Darcy Ribeiro ( 26 de outubro de 1922, Montes Claros MG - 17 de fevereiro de 1997, Brasília). Antropólogo, historiador, sociólogo, educador, político e escritor brasileiro.